2006-09-27
2006-09-23
Canto e lamentação na cidade ocupada

Com ternura, insone, canto.
Com simples flores de angústias,
canto.
Em termos de revolta, crise, sonho,
ergo, à mesa do café vazio e enorme,
meu sonho de viagem sem regresso.
Para enganar a solidão, o medo,
digo palavras, música, esperança.
Canto porque estou vivo e amarrado
à condição de ser fiel e agreste.
Porque em vão nos destroem a memória
com máquinas, rodízios, honorários.
(…)
Canto para saber que vale a pena
ter voz, músculos, nervos, coração.
À mesa do café, nas ruas, canto.
Nos jardins, nos estádios, sofro e canto.
No quarto abandonado, sonho e canto.
Nos pequenos cinemas, rio e canto.
Entre teus braços doces, choro e canto.
(Daniel Filipe, in A invenção do amor e outros poemas)
2006-09-21
Esta quinta...

Manhã cinzenta. O parapeito da janela da sala surpreende-me com água. Cortina e chão molhados. Cheiro, ainda, a laranja. Fecho a janela. Reclamo com a mancha no cortinado. Na rua os ramos caídos, as folhas em desalinho, a chuva pertinente no capuz impermeável.
Pernas ainda doridas de exercícios longos, persistentes e com caneleiras pesadas. Pés maçados dos sapatos que não servem para milongas. Caminhei rápido. Chovia, estava atrasada. A rotunda em alvoroço. Os semáforos que não abrem e as dez horas quase a chegar. Os cartazes de actividade cultural colados nos murais. Paro vezes sem conta a admirar, a ver as novidades. Reclamo do meu atraso, acelero novamente. Não me permito perder a aula de Balance. Lá dentro há velas pequenas e luminosas. Há silêncio e relaxamento. Estico-me. Dói-me o corpo. Dois minutos só para vocês, diz a Professora. E termina desafiando para nova actividade. Quando saio quase provoco um pequeno acidente. Quase que contribuo para uma queda. Há carros e chuva de novo. Voltei à rua e à dinâmica acelerada de um dia de semana.
Pernas ainda doridas de exercícios longos, persistentes e com caneleiras pesadas. Pés maçados dos sapatos que não servem para milongas. Caminhei rápido. Chovia, estava atrasada. A rotunda em alvoroço. Os semáforos que não abrem e as dez horas quase a chegar. Os cartazes de actividade cultural colados nos murais. Paro vezes sem conta a admirar, a ver as novidades. Reclamo do meu atraso, acelero novamente. Não me permito perder a aula de Balance. Lá dentro há velas pequenas e luminosas. Há silêncio e relaxamento. Estico-me. Dói-me o corpo. Dois minutos só para vocês, diz a Professora. E termina desafiando para nova actividade. Quando saio quase provoco um pequeno acidente. Quase que contribuo para uma queda. Há carros e chuva de novo. Voltei à rua e à dinâmica acelerada de um dia de semana.
2006-09-17
Na escrita...

Centro-me na importância da escrita. Nesta intimidade partilhada comigo própria. Não na escrita obrigatória, formatada por parâmetros claros e definidos. Escrevo sobre aquela escrita que me é fundamental para pensar, para organizar o que sinto, para destrinçar a filigrana de vivências, de sentidos, de inquietações e de interrogações. Centro-me nesses instantes solitários e estruturantes de organização da narrativa, de identificação de outras formas de pensar. Na recusa de alguns modelos e na escolha daquilo que não me parecia obvio. Centro-me na tarefa silenciosa de me conhecer.
2006-09-13
Talvez...
Acontecimentos significativos. O impacto do Reconhecimento e Certificação de Competências adquiridas ao longo da vida. Métodos e técnicas de investigação. Análise da realidade social. Histórias de vida. Investigação qualitativa em Educação. Competências. Análise de Conteúdo. Amostra representativa. Roteiro estruturante. Estudo de caso. Métodos biográficos. Follow – up.
Talvez por isso não tenha estado a olhar atentamente às coisas insignificantes. Talvez por isso os meus sonhos só se cruzem com papéis e livros e escrita obrigatória.
Talvez por isso acorde ansiosa. Talvez por isso me persiga a sensação de não conseguir estar, satisfatoriamente, com quem gosto.
Talvez por isso não tenha estado a olhar atentamente às coisas insignificantes. Talvez por isso os meus sonhos só se cruzem com papéis e livros e escrita obrigatória.
Talvez por isso acorde ansiosa. Talvez por isso me persiga a sensação de não conseguir estar, satisfatoriamente, com quem gosto.
2006-09-08
Resisto à chegada do Outono
Continuo a vestir vestidos, a usar sandálias e camisas de alças. A partir das 20h resisto a olhar pela janela. Pressinto que a cada instante irá ficar escuro, que as noites não serão quentes. Mas continuo com as janelas abertas com o argumento de que ainda é Setembro. Recuso-me pensar que terei que ligar o aquecedor e que irei sentir frio no pescoço, nos pés, nas mãos. Recuso-me a assumir que darei, novamente, vida a casacos e camisolas e botas e guarda – chuvas. Continuo a comer saladas e a beber muita água. Ainda me apetece planear um fim - de - semana na praia ou no rio. Ir à Barra ou à Praia do Camilo. Ir ao Carvoeiro. Fazer fotografias, espalhar protector solar, enrolar-me na areia, andar de bicicleta de noite, comer farturas nas festas, adormecer na praia,…
2006-09-07
Salta ao Muro
Talvez seja o restaurante / tasca onde mais gosto de comer. Vario pouco na ementa. Quase sempre Arieiros com batatas a murro e sangria tinta. Perto do Porto de Leixões, O Salta ao Muro, é uma pequena tasca com sabores apurados, com gente simpática e um ambiente muito informal. O Sr. Moreira recebe-nos e, enquanto esperamos, vai montando uma pequena mesa na rua para irmos petiscando presunto, broa e sangria. O nome deve-se ao facto de, há alguns anos atrás, haver uma escada que ligava o Porto de Leixões directamente ao quintal da casa. Os pescadores e trabalhadores locais só necessitavam de saltar o muro para se encontrarem dentro da habitação. Dentro, existem pouco mais de 7 mesas, com bancos corridos, com garrafões de vinho arrumados nas paredes, com presuntos pendurados e com uma selecção de fruta e de doces soberba. Penduramos os casacos e vamos metendo conversa, os senhores de fato sente-se à vontade para tirarem a gravata. A menina dos olhos azuis recebe os pedidos. É sangria, não é filha? O rapaz benfiquista, com quem temos longas conversas sobre a vida, as intermitências da vida, serve-nos o peixe, sem uma única espinha visível. Por vezes, a conversa perdura e acabamos por jantar ao mesmo tempo que o grupo de trabalho: o Sr. Moreira, a esposa (uma transmontana muito simpática), a menina dos olhos azuis, a irmã da menina e o benfiquista (primo das duas anteriores). Juntam-se ao grupo mais duas senhoras que saem da cozinha. Aconteceu várias vezes o nosso jantar demorar demasiado e terem fechado a porta da entrada. Por momentos parecia que fazíamos parte da família.
Essa escada já não existe, mas eu tenho sempre vontade de saltar o muro para a casa da Família Moreira.
Essa escada já não existe, mas eu tenho sempre vontade de saltar o muro para a casa da Família Moreira.
2006-09-05
2006-09-04
Vila Pouca de Aguiar

Regresso com curiosidade à minha terra, à minha região. Registo as novidades. Acomodo alterações. Esta Vila vai crescendo, ganhando forma de terra serena do interior, ganhando forma de vila que apela à fixação de pessoas, de empresas, de associações. Provavelmente, com maior e melhor qualidade de vida. Alteram-se praças dando lugar a novas e arejadas áreas pedonais. Altera-se, também, a mobilidade. As ruas são agora espaços muito diferentes e parece haver uma tentativa séria de proteger a zona central, que é também, a principal zona comercial. É frequente confrontar-me com alterações de sentidos de trânsito e por momentos sinto-me perdida. Tenho que parar para pensar qual será o melhor itinerário.
Integrado na sub-região do Alto Tâmega, o Concelho de Vila Pouca de Aguiar situa-se a norte do Distrito de Vila Real, entre as serras do Alvão e da Padrela. Durante o tempo em que vivi neste concelho confrontei-me diariamente com o peso da interioridade. Recordo-me da ansiedade com que recebia a Biblioteca Itinerante da Fundação Calouste Gulbenkian, das viagens intermináveis até ao Porto, do frio na Escola Primária, da falta de cinema, de teatro, … Ganhei outras coisas, é certo, que só a interioridade pode oferecer: liberdade para explorar o espaço que me rodeava.
Este fim – de – semana visitei-o. Acolhida em amizades sólidas, construídas nessa exploração do espaço, construídas no tempo e no acompanhamento dos momentos significativos, construídas devagar e sem pressa. E acolhida nessa rede, re –descrubo um novo concelho. Um concelho que tenta mostrar o património local e fazer dele uma garantia de sobrevivência. Algumas das principais alterações estão relacionadas com um investimento na rede comercial: clara aposta na comercialização de produtos da região como o granito, o mel, o cabrito, as cebolas e a castanha. Anualmente, realizam-se feiras que promovem estes produtos, e que trazem pessoas à região. Vila Pouca de Aguiar pode, agora, ser designada como a Capital do granito. O Parque Termal das Pedras Salgadas vai ser alvo de uma profunda remodelação. Há património arquitectónico e arqueológico classificado. Verifica-se, também, que proliferam Associações: de fotografia, de Caça e Pesca, de BTT, de cantares tradicionais. E há uma Casa da Cultura, antigo edifício da CP, que acolhe todas as Associações. Este sábado desafiaram-me para testar um dos percursos da Rede Municipal de Percursos de Vila Pouca de Aguiar que inclui 14 percursos pedestres de pequena rota (PR), um percurso pedestre de grande rota (GR), um percurso equestre (PE) e um percurso cicloturístico (PC), completando a mais extensa rede de trilhos sinalizados a nível nacional. À noite assisti a um concerto medieval no Castelo de Aguiar. Confesso que antes de adormecer não pude deixar de pensar, agora sob o olhar de Adulta, que deve ser bom morar numa terra assim.
Integrado na sub-região do Alto Tâmega, o Concelho de Vila Pouca de Aguiar situa-se a norte do Distrito de Vila Real, entre as serras do Alvão e da Padrela. Durante o tempo em que vivi neste concelho confrontei-me diariamente com o peso da interioridade. Recordo-me da ansiedade com que recebia a Biblioteca Itinerante da Fundação Calouste Gulbenkian, das viagens intermináveis até ao Porto, do frio na Escola Primária, da falta de cinema, de teatro, … Ganhei outras coisas, é certo, que só a interioridade pode oferecer: liberdade para explorar o espaço que me rodeava.
Este fim – de – semana visitei-o. Acolhida em amizades sólidas, construídas nessa exploração do espaço, construídas no tempo e no acompanhamento dos momentos significativos, construídas devagar e sem pressa. E acolhida nessa rede, re –descrubo um novo concelho. Um concelho que tenta mostrar o património local e fazer dele uma garantia de sobrevivência. Algumas das principais alterações estão relacionadas com um investimento na rede comercial: clara aposta na comercialização de produtos da região como o granito, o mel, o cabrito, as cebolas e a castanha. Anualmente, realizam-se feiras que promovem estes produtos, e que trazem pessoas à região. Vila Pouca de Aguiar pode, agora, ser designada como a Capital do granito. O Parque Termal das Pedras Salgadas vai ser alvo de uma profunda remodelação. Há património arquitectónico e arqueológico classificado. Verifica-se, também, que proliferam Associações: de fotografia, de Caça e Pesca, de BTT, de cantares tradicionais. E há uma Casa da Cultura, antigo edifício da CP, que acolhe todas as Associações. Este sábado desafiaram-me para testar um dos percursos da Rede Municipal de Percursos de Vila Pouca de Aguiar que inclui 14 percursos pedestres de pequena rota (PR), um percurso pedestre de grande rota (GR), um percurso equestre (PE) e um percurso cicloturístico (PC), completando a mais extensa rede de trilhos sinalizados a nível nacional. À noite assisti a um concerto medieval no Castelo de Aguiar. Confesso que antes de adormecer não pude deixar de pensar, agora sob o olhar de Adulta, que deve ser bom morar numa terra assim.
2006-09-01
O Carteiro

Simpatizo com o carteiro! Habitualmente larga a sacola das cartas para me cumprimentar, para acenar, para sorrir. Quando nos encontramos na rua enumera as cartas que me irá deixar na caixa do correio. No nosso último encontro disse-me que tem estranhado a minha ausência, que agora já não me encontra quando toca à campainha, que até têm chegado umas cartas registadas com aviso de recepção e que eu não tenho estado. Sente-se preocupado com as longas filas de espera com que agora me deparo nas estações de correio. Todas as outras cartas, avisos, comunicados, encomendas esperaram. O saco das minhas compras, que trazia e que acabei por recolher no chão, esperou. O carteiro estava preocupado. Provavelmente o seu giro será alterado e ele terá que deixar a zona, as cartas terão que ser entregues por um colega. Como terá surgido este estado de graça, de empatia, de preocupação? Terá sido despoletado por uma entrega em que eu, sem alternativa, abri a porta ainda com o cabelo molhado e de toalha enrolada?
(fotografia apresentada no1º Concurso de Fotografia Anecdótica Galega)