2007-12-26

Caixas

Arrumo a vida em caixas. Alinho-as, empilho-as, encho-as de mim, de objectos e de vivências. A casa fica diferente como se aos poucos me desvinculasse, me esquecesse, me libertasse e me arrumasse, também, na desordem emocional que por vezes sinto.
Fica tudo empilhado e, em alguns pensamentos, questiono como seria se do seu conteúdo me libertasse. Se abrisse a janela, na noite de passagem do ano, poderia verter o peso de papéis, de livros e de pastas. Poderia deixar voar os anos de acumulações. Ficaria a memória dos livros, permaneceria a vivência que não carece de papéis, quedaria a música que me acompanha no silêncio. Ficaria eu.
Porém, empilho as caixas com medo que a memória me guilhotine o passado. Reúno e lacro as caixas com medo que a janela aberta esvoace o que sou e o que fui. Arrumo. Acumulo. Lacro. Monto caixas. Arrumo. Acumulo. Lacro.
Seguir-se-á depois a manobra de reorganização, interna por certo, e que se faz acompanhar da reestruturação das gavetas, dos armários e das prateleiras. Com ela volto a remexer as cartas, as anotações, os escritos e, por isso, volto a posicionar-me naquilo que esqueço e na certeza de que é nessa exploração que conheço o meu processo de crescimento.